Prefeitura de SP teme recessão

Prefeitura de SP teme que recessão e seca comprometam investimento
Valor Econômico - 09/02/2015
Marta Watanabe e Cristiane Agostine
De São Paulo

A desaceleração da economia, a crise de abastecimento de água e a incerteza em relação à regulamentação da lei que muda o indexador da dívida com a União podem dificultar os planos de reeleição do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT). Entre todos os entes federados, o município é o maior beneficiário com a lei do indexador, que lhe abriria possibilidade de elevar o endividamento em R$ 1 bilhão a R$ 2 bilhões. O espaço fiscal é considerado imprescindível para cumprir os investimentos de R$ 6 bilhões em 2016 prometidos no início do mandato.

A aprovação em 2014 da lei do indexador foi considerada uma vitória de Haddad, mas necessita de regulamentação para ter efeito prático. Segundo o secretário de finanças do município, Marcos Cruz, a expectativa é que haja regulamentação no primeiro semestre, mas o Ministério da Fazenda não sinalizou prazos. "Temos ótimo relacionamento com o ministério.

Sabemos que eles estão no meio de um grande processo de revisão, é natural que eles levem tempo para tomar decisões. Não temos nenhuma preocupação." A regulamentação deve ser um dos principais temas da reunião que Haddad deve ter hoje com a presidente Dilma Rousseff, em Brasília.

A incerteza sobre o prazo da regulamentação, porém, tira parte da vantagem que Haddad poderia contabilizar na segunda metade do seu mandato com a vitória sobre o reajuste do Imposto sobre Propriedade Territorial e Urbana (IPTU), que renderá alta de 12% nominais na arrecadação do imposto em relação a 2014, o que significa cerca de R$ 700 milhões adicionais.

Mas o que na época em que o reajuste foi proposto prometia ser receita extra para investimentos pode funcionar mais como compensação para os efeitos da desaceleração da economia. "O IPTU ajuda, mas talvez não permita crescer tanto as receitas. Ele pode compensar a desaceleração da arrecadação do município. 2015 é um ano complicado", diz Cruz.

Os efeitos da demanda doméstica mais fraca já começaram a ser sentidos na arrecadação. A receita do Imposto sobre Serviços (ISS), principal tributo do município, cresceu 2,9% em termos reais em 2014, contra o ano anterior. Em 2013 houve alta real de 4,2% em relação a 2012. Cruz destaca que, apesar da desaceleração, o desempenho foi melhor que o do governo estadual e federal. A arrecadação do Estado caiu 2,4% em termos reais em 2014, na comparação com o ano anterior. O recuo na receita tributária federal foi de 1,9%.

Para 2015, o secretário leva em conta uma fórmula para calcular a arrecadação de ISS. Segundo Cruz, a receita do tributo costuma crescer em torno de uma vez e meia a expansão do Produto Interno Bruto (PIB). A evolução da economia para este ano, porém, é uma incógnita.

"Qual vai ser o PIB? 0,5%, 1% ou 0,5% negativo? Tem um nível de incerteza grande para ser contemplado", diz. Na percepção dele, o consenso maior é de crescimento de 0,5% do PIB em 2015.

Para ajudar na arrecadação, a prefeitura recorreu este ano ao parcelamento de tributos, o que inclui ISS e IPTU. "Não fazíamos isso desde 2011. O Estado de São Paulo fez em 2013 e 2014, a União também e a Prefeitura do Rio, em 2013. Precisa ser feito com moderação, não é um instrumento para ser usado sempre." O programa deve trazer receita adicional de R$ 300 milhões para este ano. Com isso, a previsão é de crescimento real de arrecadação de 1% a 1,5% do ISS.

A crise hídrica e um eventual racionamento de energia elétrica tornam o quadro geral mais difícil.

Uma crise de energia afetaria a indústria.

O impacto para a prefeitura viria pelo repasse estadual do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). A transferência é a segunda fonte de receita do município e no ano passado recuou 7,9% em termos reais.

A falta de água afeta diretamente a prestação de serviços e a arrecadação da prefeitura. "Nós já estamos ouvindo relatos sobre o problema da água nos restaurantes do centro e outras notícias. Isso contribui para uma situação econômica de serviços bem mais apertada", diz. "É difícil apontar causas, mas eu posso dizer que a arrecadação de serviços dos últimos dois meses já piorou em relação a igual período de anos anteriores", afirma. Em janeiro, a arrecadação de ICMS empatou em termos reais na comparação com o mesmo mês de 2014.

Crescimento zero em termos reais, reforça Cruz, significa clara desaceleração em relação à média de 2,9% reais de alta no ISS em 2014.

Esses efeitos já sinalizados preocupam porque geram pressão nas contas da prefeitura. "Muito do custeio é de gasto com escolas, hospitais e manutenção da cidade.

São gastos pouco comprimíveis." Mesmo com a economia fraca, a prefeitura entregou no ano passado um resultado primário de R$ 1,2 bilhão, com expansão de 7% reais nos investimentos em relação a 2013, embora a base de comparação seja baixa. Em 2013 houve retração real de 1% contra o ano anterior. Cruz acredita ser possível avançar este ano em relação aos R$ 4,5 bilhões investidos em 2014, mas não arrisca cifras.

Para isso, conta com elevação das transferências federais. Entre elas, do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O ritmo de execução, porém, ainda está longe de completar os R$ 8 bilhões em recursos federais alardeados pela presidente Dilma Rousseff em 2012. No biênio 2011/2012 as transferências de capital da União para o município somaram R$ 100 milhões. No biênio 2013/2014, R$ 400 milhões. "Não tenho por que não acreditar que esse número seja muito maior este ano, dado que as obras estão aí." Para este ano, espera R$ 500 milhões. "O ajuste fiscal do governo federal não deve reduzir as transferências. Os investimentos do PAC não afetam o resultado primário da União e isso é prioridade para o governo federal." Segundo ele, os anos anteriores foram predominantemente de estudo, licitações e medições nos projetos do PAC na cidade.

Agora, diz, começou a fase de obras, o que deve acelerar as transferências e contribuir para os investimentos um ano antes das eleições para prefeito. "O deslanchar este ano é uma consequência natural do que já aconteceu. Não tem como acelerar no primeiro ano, porque é quando você está montando o seu portfólio de projetos. Agora a gente está colhendo os projetos que foram realizados." Outra estratégia da prefeitura é executar recursos disponíveis há algum tempo. Trata-se do superávit financeiro resultante de recursos carimbados para investimentos específicos, como a arrecadação do programa de operações urbanas. "Vamos terminar com esse superávit em R$ 2,5 bilhões, mas conseguimos reduzir isso para aumentar investimentos. No ano passado foram executados por volta de R$ 1,4 bilhão de fundos e operações urbanas e isso ajudou a elevar investimentos." A prefeitura pretende lançar até março o edital do que pode se tornar uma vitrine para uma campanha de reeleição de Haddad. Tratase da Parceria-Público Privada (PPP) da iluminação pública, contrato de R$ 7 bilhões que, segundo a prefeitura, modernizará o sistema de iluminação de toda a cidade em cinco anos. O investimento total nesta PPP deve ser entre R$ 2 bilhões e R$ 3 bilhões. Segundo Cruz, a expectativa é de que até o fim de 2016 sejam investidos R$ 1 bilhão.