Título: BMG aposta em parceria com Itaú para manter credibilidade
Autor: Moura , Marcos de
Fonte: Valor Econômico, 13/11/2012, Política, p. A10

Há pouco menos de um mês, os banqueiros mineiros do BMG vivem na condição - inédita para eles - de condenados à prisão. A Justiça Federal em Minas Gerais os considerou culpados por crimes contra o sistema financeiro num processo relacionado ao do mensalão. A sentença abateu a família Pentagna Guimarães - tradicional e dona de muitas empresas em Minas -, mas o que seus integrantes têm dito é que até agora os negócios do banco, que como toda instituição financeira depende de sua credibilidade, não teriam sido afetados.

Os controladores do BMG têm repetido em conversas reservadas que o banco foi preservado de um golpe em sua credibilidade graças, em grande parte, à sociedade firmada em julho com o Itaú Unibanco para criação de um novo banco especializado na concessão de crédito consignado, aquele em que as prestações são descontadas diretamente na folha de pagamentos. O termo usado no BMG é que o acordo revestiu o banco mineiro com uma "blindagem" contra potenciais reflexos em sua imagem após a condenação.

O novo banco, batizado de Itaú BMG Consignado, nasceu com um capital de R$ 1 bilhão, sendo que o Itaú injetou 70% desse total e o BMG, os demais 30%. Essa nova instituição, portanto, é controlada pelo Itaú, que também é o responsável pela gestão. O novo banco está totalmente segregado de eventuais riscos de imagem ou de liquidez do BMG. A questão é que, além dessa joint venture, o BMG continua a existir como banco, controlado pelos Pentagna Guimarães e sem nenhuma vinculação societária com o Itaú.

O patriarca Flávio Pentagna Guimarães, de 84 anos, presidente do conselho de administração e acionista controlador do BMG, seu filho, Ricardo Annes Guimarães, atual presidente do banco mineiro, e o vice-presidente executivo, Márcio Alaor de Araújo, foram condenados a cumprir penas de cinco anos e seis meses a sete anos em regime semiaberto.

A sentença, em primeira instância, foi determinada pela Justiça Federal em Belo Horizonte. Eles têm o direito de recorrer em liberdade. A juíza Camila Franco e Silva Velano entendeu que os três - mais João Batista de Abreu, que não está mais no banco - foram responsáveis por empréstimos, que ela classificou como "simulados", ao PT e a empresas do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, já condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Empréstimos que, pela acusação, ajudaram a engrenagem do esquema do mensalão.

O processo é um dos desdobramentos de uma ação penal que também deu origem à Ação 470, a do mensalão, cujo julgamento está na fase final no STF. Os executivos do BMG não são réus no processo do mensalão.

Como em qualquer banco, o BMG tende a ter sua credibilidade muito associada à imagem de seus donos. O momento já era difícil para bancos médios do país por causa das fraudes encontradas no PanAmericano e no Cruzeiro do Sul, entre outros. Essa condenação, se confirmada em instância superior, obrigará a família a se afastar da gestão do banco.

Mas pessoas próximas da instituição têm dito que não houve saques acima do normal, a despeito da condenação da cúpula do banco. O BMG tem patrimônio de R$ 3 bilhões, gira cerca de R$ 1 bilhão por mês em operações de crédito, tem 85% de sua produção vinculada ao consignado, 35 mil pessoas vendendo seus serviços e 6 mil agências. Especialista em crédito consignado, tornou-se o segundo maior participante desse mercado - atrás apenas do Banco do Brasil - e dono de uma carteira de R$ 29 bilhões.

No meio financeiro, avalia-se que, se o acerto com o Itaú já não tivesse sido fechado antes das sentenças de prisão, o negócio poderia até não ter sido fechado. O acordo foi selado 14 semanas antes das sentenças.

A juíza Camila Velano escreveu na sentença que os dois banqueiros, o vice-presidente e João Batista de Abreu foram responsáveis por empréstimos ao PT e a empresas ligadas a Valério que "não tinham como objetivo serem realmente adimplidos, constituindo-se como instrumentos formais fictícios, ideologicamente falsos, cuja real intenção era dissimular o repasse de recursos aos tomadores".

Segundo a juíza, diversos elementos apontados pelo Ministério Público Federal compõem um cenário onde se identifica "a prática da gestão fraudulenta por parte dos dirigentes do BMG". Na sentença, ela insiste que o banco não tinha real intenção de cobrar os valores. "Extrai-se ainda e, principalmente, que grande parte dos valores amortizados adveio de recursos do próprio BMG, ou seja, o BMG praticamente pagava para emprestar."

Os condenados do BMG protocolaram na 4ª Vara Federal em Belo Horizonte a intenção de apresentar um recurso à condenação. Pelo rito, quando forem chamados para se pronunciar, formalizarão, então, sua defesa, encaminhando um recurso ao Tribunal Regional Federal em Brasília. A expectativa no banco é que, uma vez que o processo siga para instâncias superiores, as condenações caiam por terra.

O BMG concedeu um empréstimo de R$ 2,5 milhões ao PT em fevereiro de 2003 - quando o presidente Lula iniciava seu primeiro mandato. Concedeu também um empréstimo de R$ 10 milhões a Rogério Tolentino, à época sócio e advogado de Marcos Valério. E concedeu R$ 12,5 milhões à agência de publicidade SMP&B, de Valério, que antes das denúncias sobre o mensalão era uma das mais prestigiadas de Minas.

O Banco Central avaliou depois das operações que o BMG cometera falhas nos empréstimos e decidiu punir seus executivos, impedindo-os de administrar instituições financeiras por três anos. Em dezembro do ano passado, no entanto, o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro (CRSF) reviu as sanções e, em vez do afastamento compulsório por três anos, determinou a aplicação de R$ 25 mil a R$ 100 mil em multas aos executivos. O órgão, conhecido como Conselhinho, justificou que, a seu ver, os administradores não chegaram a colocar a saúde financeira do BMG em risco.

Após a decisão, instalou-se na cúpula do banco a sensação de que o processo na Justiça Federal não resultaria em condenação. No banco a rotina não mudou. Flávio e Ricardo Guimarães e Alaor seguem com suas atribuições e compromissos diários.